Caixa de nada

comia a comida suja
que encontrara no lixo

limpava a boca também
como um legítimo rei
na camisa deveras suja

andara rumo ao mato
agachara e vasculhara profundo
achou sua pinga sagrada

Sinfonia da destruição

apenas marionetes dançando
na rua colorida triste
entre enfeites e absurdos

Desempenho Insatisfatório

dentro de explicações inexplicáveis
dentro do saber desconfiado
dentro do dentro interior

apenas línguas sem discursos

Espinha

uma parada de dois
a benção no peito
uma ameaça de compasso

Libélula

batiam como que encantados
a dormência então prevalecia
batia também um coração

O lado finito do infinito

somente bobo não enxerga
o ponto posto aqui
a vírgula que separa
o nada com nada

digo bobo da alma
quase como diria alberto caeiro
ao analisar a poesia
de ricardo reis e álvaro de campos:

um futurismo meio metrificado

Convite

chorou muito quando descobriu
que não possuía mais

até a lágrima saiu
para nunca agora voltar

Abril

olhava as fotos antigas
sorrisos falsos e verdadeiros
quem lhe poderia desmentir?

Outubro

uma planta da primavera
cores que chegavam
a nuvem também chorava

Day of profanation

entrou no supermercado
comprou refrigerante e pinga

pedra 90

ou como diz
o francês de raiz
pièrre quatre-vingts-dix

misturou tudo bem quente
fez um kit impecável
pegou o copo descartável

500 ml não sei

virou de uma vez
tudo sem parar
gorfou na pia

do banheiro do bosque

Aniversário impossível para mim

na neblina bastante clara
no tempo perdido talvez
aquele suspiro triste

Pancronia

caminhava olhando para cima
desviava de postes buracos

só não desviou
num dia de distração
do pingo da chuva

que entrou pelo nariz

Curioso

andava como que sonhando
batia a cabeça forte
se via atrás confuso

as vistas eram pistas

tinha um relógio maneiro
com todos os fusos

mostrava cicatrizes sinistras

Guru radical

dentro de uma nuvem
que passava bem devagar
tudo ocorria bastante acelerado
em fogo angústia ar

esmero mal zelo sublime
uma força que passa
um raio que desce
um fonema que oprime

tudo e nada
na morte na vida

Dia dos pais

tem dia que dá

tem dia que não dá

Antes de levantar

está parado bem quieto
olha não sei onde

gesticula braços e ombros
faz sombras sem notar

percebe que o passado
precisa ser revisitado
para então se fazer
novamente tudo errado

Quinta-feira

estou fazendo errado

e acertando sempre

nos sonhos nos mundos

nas ruas escuras misteriosas

que todos conhecem bem

Escola

ansioso como um cachorro
de raça misturada
procurando a bolinha-ossinho

não consigo mais correr
alguma coisa me acertou

para sempre assaz eternamente

Polaco

thumack não morreu
thumack não brochou
thumack soprou

por ele está legalizado

desde criança ouve deveras
que vai virar perigoso
a lei é sua

inimiga

têm pessoas que defendem
o direito de ser
aquilo que irremediavelmente são

Peut-être

contra a lei
contra o método

paradigmas anárquicos
não há verdade
mas no plural sim

sem os universais
sem os mentirosos
com muita conjuntura

histórias bestas sem fim

Domingo sem graça

muito rápida passagem
como se nunca existisse

sem tempo de saudade
deveras difícil de esquecer

a vida foi atropelada
a placa não apresentada
mas não importa mais

nunca mais para sempre

fatigados os braços doem
e o coração também

Little bird

descendo o abismo infinito
cheguei em conclusões estreitas

parece tudo se contradizer
e tudo dizer
o dito não dito
outras coisas sendo faladas

atrás das palavras
atrás de tudo
sempre atrás sempre atrás

talvez subterfúgios de expressar
que disse sem pronunciar
sem enunciar.

o interdito

o acontecimento

Antes de viajar

cai no frio clima
e fui esquentado paulatinamente

pulmões cheios de tudo

a cabeça nada vazia
a mochila cheia
dor nas costas

por uma vida nova

Tempo perdido

não somos
o que podemos ser

nem sabemos
o que seríamos
o que poderíamos ser

a ilusão da escolha
da livre liberdade abstrata
a opaca obscura segurança

uma mentira às vezes
uma ideologia se posicionando
o sentido sem controle

o sujeito o Sujeito
um Outro/outro e outros

Já olhou atrás das palavras?

na carência do erro
parece ter esquecido tudo

tempos que não voltam
no mesmo momento observado

o devir é eterno
o inferno são os outros
o inferno é a repetição

Liberdade

il est allé loin
et il a vu tout

il a écouté beaucoup de voix

Plus jamais ça!

seus olhos seguiram baixos
vendo tudo do chão
ouviam sons diversos irregulares.

uma pedra no caminho
a chutou e caiu
ralou o joelho esquerdo.

chegou ao canto desejado
suspirou a vida fria
aquecendo deveras os pulmões

Aula cancelada

pelo frio vento passante
se percebe um amor
que poderia acontecer

pelo mesmo vento errante
chega junto uma dor
mordente em amar sofrer

pelo sempre tempo infinito
que é tempo demais

Carnaval

filas e filas mais
pra mijar comer entrar

não bebe-se muito
mesmo perto do freezer

finge que gosta deveras

um dia bem divertido

Libido Secreto Divino

a noite azul flamejava
derretia os sentimentos todos
modificava cada canto desencanto
levava para onde queria

fazia voltar bem devagar

This is what I say when I pray

a queria sempre perto

ao lado em cima

em todos os cantos

falando sorrindo chorando mentindo

e nada mais

Gás Liquefeito de Petróleo

numa caminhada noturna soturna
o mendigo filipe albuquerque
fala pro amigo desconhecido

"quero só vinte"

o amigo desconhecido sorrindo
diz cafungando o nariz

"então sobe no caminhão"

escutaram funk conversaram muito
(...).

filipe albuquerque acorda assustado
com sol na cara
duas horas da tarde
dentro do balaio estreito

liga pro amigo girú
pede uma carona
girú cobra dez reais

pro gás

Bonne année 2014

c'est tout
c'est fini

j'en ai marre

recommencer